Em entrevista à DW Brasil, ministro alemão do Exterior diz que o Brasil é uma potência que ganha cada vez mais influência política e que a América Latina é subestimada pelos europeus. "Essa avaliação precisa mudar".
Westerwelle: "Europeus devem repensar conceitos e construir novas alianças estratégicas" |
O ministro alemão do Exterior, Guido Westerwelle, afirmou em entrevista à DW Brasil que os europeus "devem repensar certos conceitos e construir o quanto antes novas alianças estratégicas e parcerias, e a América Latina desempenha um papel-chave nisso".
Westerwelle também comentou a crescente presença do Brasil no cenário político internacional. "O Brasil é uma potência, é um país que, internacionalmente, se desenvolve de forma muito dinâmica, não só economicamente, mas também está ganhando cada vez mais influência política."
Segundo ele, a atuação internacional do Brasil mostra "que o mundo do século passado foi superado de forma irreversível." Ele elogiou o discurso da presidente Dilma Rousseff na abertura da mais recente Assembleia Geral das Nações Unidas, afirmando que a fala evidenciou pontos em comum entre Brasil e Alemanha.
A entrevista foi concedida nesta quarta-feira (23/11) em Berlim, durante a conferência "América Latina em Transformação", promovida pelo Ministério do Exterior da Alemanha.
DW Brasil: Qual foi o intuito do Ministério do Exterior da Alemanha ao organizar, em Berlim, a Conferência "América Latina em Transformação"?
Guido Westerwelle: A América Latina é um continente de grande dinamismo e importância estratégica para a Alemanha e a Europa. A América Latina é, ao mesmo tempo, um continente subestimado e um continente com grandes potenciais. Isso vale não só para a cooperação econômica, mas se aplica explicitamente no que diz respeito à cooperação política. Neste nosso mundo em transformação, novos centros de poder estão surgindo, e a América Latina e o Caribe, sem dúvida, fazem parte deles.
Assim como o Brasil, a Alemanha está lutando por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Mas o Brasil se absteve por exemplo, na votação de uma resolução contra a Síria na Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, e prefere o diálogo com o Irã ao invés do uso de uma maior pressão sobre a república islâmica. Uma potência emergente como o Brasil não deveria se posicionar mais claramente em defesa dos direitos humanos?
O Brasil e a Alemanha não estão unidos apenas pelo desejo comum de assumir mais responsabilidades no Conselho de Segurança, como também na avaliação comum de que um Irã com armas nucleares é algo inaceitável. Cooperamos de forma muito estreita e afinada em muitas questões, também no Conselho de Segurança da ONU, e o próprio fato de o Brasil atuar de forma tão determinada também na política mundial mostra que o mundo do século passado foi superado de forma irreversível.
O Brasil é uma potência, é um país que, internacionalmente, se desenvolve de forma muito dinâmica, não só economicamente, mas também está ganhando cada vez mais influência política. O discurso de abertura da nova presidente do Brasil na Assembleia Geral das Nações Unidas foi muito impressionante e definiu prioridades que estimamos muito. E dá para perceber que as nossas posições culturais comuns, principalmente no que diz respeito à proteção da privacidade, à individualidade, aos direitos humanos e civis, também nos unem.
Os países do Brics, incluindo o Brasil, ofereceram ao FMI ajuda financeira para lidar com a crise da dívida europeia. Como os países do Brics podem ajudar?
Temos uma crise na Europa e vamos superá-la. E ficamos satisfeitos com a interconexão econômica mundial, que se amplia constantemente. Só entre os anos 2005 e 2010, o intercâmbio comercial entre Brasil e Alemanha aumentou 60%, ou seja, quase três vezes mais que em outras regiões comparáveis nesse mesmo período. E a maior comunidade econômica alemã fora da Alemanha fica em São Paulo. Isso, por si só, já mostra que o estreito intercâmbio econômico e a estreita cooperação política são de interesse mútuo.
Com a minha política externa, quero manter, claro, as velhas amizades e parcerias: as alianças europeias, a aliança transatlântica. Mas também quero que os novos centros de poder no mundo ganhem mais nossa atenção. O mundo como ele era na minha juventude não existe mais.
A América Latina da minha juventude era muitas vezes associada a temas como ajuda ao desenvolvimento, e hoje vemos que três países latino-americanos estão conosco no G20, sentados à mesma mesa, em pé de igualdade. Isso mostra que na Europa devemos repensar certos conceitos e que devemos construir o quanto antes novas alianças estratégicas e parcerias, e a América Latina desempenha um papel-chave nisso.
Nos campos da ciência e da cultura, o Brasil e a Alemanha têm uma estreita cooperação, como prova o Encontro Econômico Brasil-Alemanha, um fórum importante, que é realizado anualmente. O senhor acha que as intensas relações bilaterais entre os dois países são percebidas pela opinião pública?
A opinião pública e as discussões públicas ainda se encontram bastante defasadas em relação à situação real. Há muito tempo olhamos de forma muito interessada para a Ásia e para a dinâmica do continente, e damos muito pouca atenção à América Latina e às jovens sociedades que ali emergem e ascendem. Quando na Alemanha falamos sobre desenvolvimento demográfico, geralmente nos lembramos da nossa estrutura etária envelhecida e das necessidades relacionadas com os sistemas de segurança social.
Quando falo de desenvolvimento demográfico, refiro-me ao desenvolvimento demográfico do mundo e uma grande porcentagem de pessoas na América Latina, especialmente no Brasil, é jovem, eles são ambiciosos, dinâmicos, arrojados e, portanto, também é importante que nos unamos e mantenhamos nossas estreitas amizades e fundemos parcerias estratégicas, fundamentadas em nossas raízes culturais e históricas.
* Autor: Marcio Damasceno - Revisão: Alexandre Schossler
Extraído do sítio Deutsche Welle
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