Nos Estados Unidos, o dinheiro se concentra em mãos de pouca gente e essa distribuição de ingressos e riqueza "ameaça que nos tornemos uma democracia somente de nome”, adverte o economista Prêmio Nobel, Paul Krugman.
"Nossos políticos são pouco mais que lavadores de dinheiro no tráfico de poder e político; pouco menos de seis graus de separação do espírito e das táticas de Tony Soprano”, afirma o grande jornalista veterano Bill Moyers. Agrega que "não há mistério no porquê o Parque Zuccotti (Praça Liberdade) está cheio de gente. Os jornalistas continuam arrancando os cabelos e perguntando ‘por que estão aqui?'. Porém, está claro que estão ocupando Wall Street porque Wall Street está ocupando o país”.
Manifestantes de Ocupa Wall Street. Foto Mike Fleshman |
Moyers, em um discurso sobre o tema, comenta que muitos se perguntam por que os manifestantes não canalizam sua energia no âmbito partidário eleitoral e assinala que a "democracia” não está funcionando nesse país, com líderes de ambos partidos na defesa dos mais ricos, ou como o presidente Barack Obama, que aceita suas doações enquanto somente na retórica denuncia a Wall Street e a cúpula econômica.
"Levamos a cabo eleições sabendo que é pouco provável que produzirão as políticas que a maioria de estadunidenses favorece. Nos expressamos, escrevemos, advogamos; porém, os que estão no poder se mantêm surdos e cegos às nossas aspirações mais profundas. Solicitamos, instamos e até oramos da mesma forma no mundo, que é nossa terra comum, que deveria ser entregue em boas condições às próximas gerações, continua sendo saqueado”, declara Moyers.
Os fatos o comprovam
Mais de 14 milhões estão desempregados, outros 10 milhões não encontram emprego pleno; um em cada 6 estadunidenses está na pobreza, mais de 6 milhões perderam suas casas devido á crise hipotecária e mais, enquanto que 1% mais rico multiplica seus ingressos e controla cada vez mais a riqueza nacional (já controla os 40%), sobretudo os vinculados ao setor financeiro.
Os maiores bancos são ainda mais enormes hoje em dia que quando Obama assumiu a presidência e estão recuperando os níveis de utilidades que gozavam antes da recessão de 2008, enquanto as casas financeiras de Wall Street conseguiram gerar mais utilidades nos primeiros dois anos e meio de Obama das quais ganharam durante os oito anos da presidência de George W. Bush, divulgou o Washington Post nesse fim de semana.
A indústria financeira – Wall Street - conseguiu isso depois de ser resgatada do colapso com milhares de milhões em fundos públicos e políticas do governo que permitiram que se recuperasse sua posição proeminente na economia. Porém, em vez de utilizar toda essa assistência pública para regenerar o crescimento econômico, as empresas financeiras regressaram ao mesmo jogo do cassino que provocou a pior crise desde a grande depressão. O governo não foi tão generoso em seu apoio aos milhões de trabalhadores que estão pagando os custos da crise.
Com tudo isso, não se necessita muito mais para explicar porque o movimento Ocupa continua crescendo.
Todo um elenco de figuras –tanto liberais quanto conservadores- tentam, reiteradamente, reduzir ou descartar a relevância do movimento. O colunista conservador David Brooks (nenhuma relação com esse jornalista que aqui escreve), do New York Times, tenta, desde seu trono de observação, empapado de arrogância intelectual, reduzir o movimento a algo sem bússola, pouco sério e até um pouco "radical”. Outros, indicam que, enquanto não entendam que têm que trabalhar dentro dos esquemas político-eleitorais desse país, não poderão fazer muito. E outros insistem em que sem formular demandas concretas não conseguirão ser mais do que uma expressão de protesto.
"Tenho uma recomendação para uma resposta: nós demandamos que vocês deixem de demandar uma lista de demandas”, comentou Robert Jensen, professor de jornalismo na Universidade do Texas, em um artigo em Al Jazeera. Argumentou que "a demanda de demandas é uma tentativa para acomodar as concentrações Ocupa à política convencional, reduzir a energia dessas concentrações a uma forma que os que estão no poder possam reconhecer, para que, dessa forma, possam desenvolver estratégias para desviar, cooptar, comprar ou –se essas táticas fracassam- esmagar todo desafio ao business as usual”.
Moyers assinala que não é a primeira vez que o país enfrenta isso. Em outro momento, uma oradora popular, Mary Elisabeth Lease, afirmou que "Wall Street é dono do país... Nossas leis são resultado de um sistema que veste malandros a rigor e de andrajos à honestidade. Os partidos políticos nos mentem e os oradores políticos nos enganam... O dinheiro governa”. Isso foi em 1890.
Hoje em dia, o que está em jogo é se os Estados Unidos ainda podem ser reconhecidos como uma democracia. Para o economista Prêmio Nobel Paul Krugman, o que está criando é uma "oligarquia estilo estadunidense”. Em sua coluna no New York Times, afirma: "temos uma sociedade na qual o dinheiro está cada vez mais concentrado em mãos de pouca gente...; essa concentração de ingresso e riqueza ameaça tornar-nos uma democracia só de nome”. Isso porque "a concentração extrema de ingresso é incompatível com a democracia real”.
E, enquanto se determina qual será o destino da democracia nesse país; enquanto milhões escutam a seus políticos prometerem que gerarão empregos e novas oportunidades, a que se dedicou o Congresso? Aprovou uma resolução reafirmando que "Em Deus confiamos”, é o lema oficial dos Estados Unidos. A votação foi de 396 contra 9, na Câmara de Representantes.
Pelo menos nos plantões de Ocupa Wall Street, a democracia é levada a sério.
* David Brookes é Correspondente do diario La Jornada nos EUA.
Extraído do sítio da Adital
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