As 'maquiladoras' se beneficiam dos privilégios que lhes são outorgados pelo governo mexicano e que lhes permitem explorar seus trabalhadores. O congresso daquele país debate uma reforma trabalhista. Vai melhorar a situação? Por Isabel Caro e Marta Garrido
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Nos anos 1960, o governo mexicano impulsionou um novo modelo de fábrica manufatureira com o objetivo de industrializar o país: as chamadas 'maquiladoras'. Atualmente, existem mais de três mil delas ao longo dos dois mil quilômetros de fronteira entre o México e os Estados Unidos, nas quais mais de um milhão de mexicanos estão empregados. Mas... a que preço?
Mago Ávalos trabalhou em uma maquiladora de Tijuana durante quatro anos, onde recebia cerca de 50 dólares por semana. Sua jornada, teoricamente, era das duas da tarde às 9h30 da noite, mas era obrigada (contra a opção que consta da lei mexicana) a fazer horas extras: “Na verdade, trabalhava das duas da tarde às seis da manhã”, conta.
Além disso, ela assegura que os patrões obrigam os empregados a trabalhar em ritmo “cada vez mais acelerado e com mais qualidade”. Mago tinha o objetivo de empacotar quinhentas meias-calça por hora: “A única forma de conseguir isso é trabalhar sem sair para tomar água ou ir ao banheiro, comer muito rápido ou até não comer. Porque não cumprir a meta pode significar demissão”.
Vivendo na pobreza
Depois do trabalho, as vidas dos empregados das maquiladoras transcorrem em acampamentos conhecidos como 'colônias', carentes dos serviços mínimos, como água potável, luz elétrica ou rede de esgoto. Mago afirma também que há muita violência nessas áreas. O jornalista estadunidense David Bacon, que visitou algumas delas para suas reportagens, as define como “áreas com caminhos de terra à margem das cidades”.
Beneficiados
Desde a criação das maquiladoras e principalmente a partir do Tratado de Livre Comércio da América do Norte, algumas potências, especialmente os Estados Unidos, as utilizaram para melhorar sua competitividade internacional com os privilégios que lhes foram oferecidos por diversos governos mexicanos.
Enrique Dávalos, presidente da Rede de Solidariedade de San Diego, explica que “as maquiladoras pagam menos impostos que as empresas mexicanas, utilizam uma força de trabalho muito barata e possuem regulamentações ambientais que nunca são cumpridas”. A falta de cumprimento dessa legislação permite, segundo Dávalos, que as indústrias reduzam custos enquanto contaminam a vida dos trabalhadores, a terra e os animais que vivem próximos das zonas industriais das maquiladoras.
Sem defesa
O governo impõe obstáculos a qualquer tipo de organização, de acordo com Bacon: “Se as pessoas decidem criar um sindicato independente ou exigem salários mais altos ou um tratamento mais justo, o governo toma ações legais. Se há greve, a polícia age com represálias." São colocados muitos obstáculos aos trabalhadores, a ponto de demiti-los ou encarcerá-los. Mago fala de sindicatos ‘fantasmas’: “Na empresa em que trabalho, os empregados não tinham visto o sindicato em 40 anos. Começamos a reivindicar direitos e então ele apareceu para nos dizer que não podíamos nos mobilizar porque eles eram nosso sindicato”.
Esta falta de representação permite que muitas trabalhadoras sofram a discriminação no corpo. “O assédio sexual é comum nas maquiladoras. Geralmente se dá por parte da administração e caso as mulheres não cedam aos pedidos sexuais dos patrões, são ameaçadas ou demitidas”.
"Tudo em ordem"
A Secretaria de Trabalho do México garante que a indústria maquiladora está sendo estigmatizada e insiste que a situação dos empregados melhorou. A subsecretária de Inclusão Trabalhista, Patrícia Espinosa, argumenta que “a indústria maquiladora, especialmente no setor químico e também no têxtil, melhorou muito as condições, praticando tudo o que a lei exige. Dão boas condições e têm cuidado com suas trabalhadoras. Evitam a rotação de pessoal e oferecem cursos de capacitação.” No entanto, Espinosa admite que ainda não se conseguiu que 100% das maquiladoras eliminem as más práticas.
Reforma Trabalhista
O governo mexicano pretende mudar a lei trabalhista vigente no país. Críticos preveem que a reforma prejudicará os trabalhadores das maquiladoras. Bacon acredita que tornará o custo da mão de obra ainda mais barato, deve piorar as condições de trabalho e aumentar a vulnerabilidade dos operários.
A Secretaria do Trabalho defende a nova lei “necessária para o México, porque a atual tem 40 anos e não está adaptada à atualidade”. Espinosa assegura que, ainda que a lei pretenda incentivar a produtividade, deve continuar defendendo os trabalhadores: “Pede maior produtividade, mobilidade e flexibilidade e contempla modalidades de trabalho que são importantes para as jovens, grávidas ou idosas, que podem trabalhar em períodos curtos, por horas e com benefícios sociais”.
A Reforma Trabalhista está sendo debatida atualmente no congresso mexicano e há que se esperar para saber se melhorará a situação das maquiladoras. No entanto, Mago considera essa reforma como “uma mentira que vai permitir a legalização da violação dos direitos trabalhistas que acontecem atualmente”. Diante disso, reivindica "que o governo respeite os direitos trabalhistas que temos e os direitos humanos, porque antes de sermos trabalhadores, somos seres humanos. Não é possível que o governo permita que a indústria viole os direitos fundamentais.”
Extraído do sítio RNW - Radio Nederland Internacional
Extraído do sítio RNW - Radio Nederland Internacional
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