Plebiscito divide moradores da capital e do interior em meio a falsas comparações com Tocantins.
Dezembro é mês de ir às urnas... no Pará. O plebiscito marcado para o dia 11 vai decidir se o estado será partido em três – com a criação de Carajás e Tapajós. Até aqui, conseguiu dividir a população do estado. Os contrários à ideia argumentam que por trás dos discursos políticos há bem mais do que segundas intenções, enquanto os defensores do desmembramento evocam até mesmo o que chamam de “precedente estimulante” de Tocantins, ex-Goiás. Evocam, mas não explicam o contexto histórico totalmente diferente do caso do Pará.
A criação de Tocantins, selada na Constituição de 1988, não só contou com o apoio da maioria das elites regionais como previu um forte aporte financeiro do governo federal para os primeiros dez anos do novo estado. Os dois fatos não se repetem no caso do Pará.
Uma questão irrelevante, na opinião do deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA), membro da Frente Parlamentar a favor da criação do estado de Carajás. Queiroz tem domicílio eleitoral em Redenção, município que ficaria nesse novo estado. “Nosso potencial é muito superior, não precisamos de nenhum centavo”, afirma o deputado, ao mesmo tempo em que menciona Tocantins como exemplo de desenvolvimento desde que se desvencilhou de Goiás.
Para ele, o desmembramento é “o maior projeto de desenvolvimento do estado e da Amazônia. Quero a divisão por vergonha de conviver com as discrepâncias sociais. Com o governo mais próximo, poderemos discutir melhor as políticas industriais”, defende Queiroz.
Conjuntura internacional favorável
Já o deputado federal Arnaldo Jordy (PPS-PA), integrante da Frente Parlamentar contra a criação do estado de Carajás, argumenta que a divisão vai tirar a chance de o Pará distribuir renda justamente num momento de conjuntura internacional favorável.
“A riqueza do estado sempre ficou à margem da economia mundial. Justo agora, com o aquecimento global em pauta, temos a chance de mudar isso em prol de todas as regiões. Hoje somos o almoxarifado do desenvolvimento alheio, mero fornecedor de matéria-prima. O novo território concentra o poder financeiro em Carajás, onde estão as maiores reservas minerais a céu aberto do planeta, administradas pela Vale do Rio Doce”.
Até 1970, Carajás e Tapajós eram dominados pelo poder regional de donos de plantações e comerciantes de castanhas e comerciantes de castanhas. Em 1979, com a descoberta de Serra Pelada, um enorme contingente de garimpeiros afluiu para as regiões, até que no ano seguinte a Companhia Vale do Rio Doce fincou base em Carajás. Outras atividades econômicas foram atraídas, especialmente grandes projetos agropecuários, que compõem o atual cenário econômico. Mas, com eles, aumentou o coro de “localidade abandonada pela capital”, pois os poucos projetos eram da União. Pior: a estrutura do governo estadual foi sucessivamente composta quase que só por representantes da capital, acirrando ainda mais os ânimos das elites políticas e econômicas do interior.
Ganhos políticos evidentes com a divisão
“Enquanto existirem os desequilíbrios sociais e regionais, haverá condições para que surjam movimentos capitaneados pelas elites reivindicando autonomia político-administrativa no Brasil. O Estado nacional brasileiro e a Federação brasileira não são coisas acabadas. Pelo contrário, estão em construção, e tais movimentos são a prova disso”, explica o sociólogo Herbert Toledo Martins, professor da Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB) e autor de uma tese de doutorado sobre a fragmentação do território brasileiro.
Não é à toa que tramitam no Congresso Nacional vários projetos que, somados, deixariam o Brasil com 40 estados – a maioria nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Mais até do que ambições desenvolvimentistas, o que inspira a discussão, muitas vezes, são os ganhos políticos que a criação de um novo estado pode representar para as elites regionais.
“Evidentemente, os políticos dos novos estados serão beneficiados em virtude das verbas federais para a construção das secretarias, Assembleia, tribunais, hospitais, escolas, universidades, aeroportos e tantas outras instituições que a criação de um estado requer. Criar um novo estado significa criar um centro de poder, uma estrutura de atividades, de papéis e pessoas dentro de uma rede de instituições e de burocracias. Centenas de novos cargos serão criados, e isso é do interesse direto de deputados e senadores e de suas bases eleitorais”, sustenta Herbert.
O fato é que o debate mobiliza a população paraense e, desde outubro, a Internet foi inundada por vídeos pró e contra a divisão. Caso seja criado, Tapajós teria 722 mil quilômetros quadrados – maior que a soma de Espanha, Portugal, Áustria e Suíça. Já Carajás ficaria com 258 mil quilômetros quadrados, área maior que a da Inglaterra e da Bélgica juntas.
Saiba mais
Para saber mais sobre o tema, confira também nossa entrevista com o sociólogo Herbert Toledo Martins, na qual ele fala, entre outras coisas, sobre o contexto histórico das divisões territoriais no Brasil. Leia também os artigos do deputado federal Arnaldo Jordy (PPS-PA), que defende a manutenção do atual território paraense, e do deputado federal Giovanni Queiroz (PDT-PA), que luta pelo desmembramento do estado.
Extraído do sítio da Revista de História
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