A Itália manteve uma discreta posição em relação aos recentes linchamentos liberadores na Líbia. Entende-se. Afinal de contas, a Líbia foi deles, italianos. Quem foi invasor e usurpador sempre será vossa mercê.
A Itália, nesta semana que passou, colaborou com a crise na eurozorra, perdão, digo eurozona, com imaginativas e concretas propostas para ferrar a Grécia em um calote de mais de 100 bilhões de euros.
Pelo pouco que entendi, foi inestimável a participação do premiê italiano, o controvertido Silvio Berlusconi, na solução do conflito financeiro. Claro que no Parlamento italiano saiu um pau entre deputados à melhor maneira dos filmes dos saudosos Totó e Alberto Sordi.
Sem Berlusconi, a Itália não seria a Itália. Viraram, mexeram, mas não derrubaram o homem que continua liderando o governo de coalizão de centro-direita com a Liga Norte do pouco divertido Umberto Bossi, uma espécie de Paolo Stoppa sem talento.
O importante é abrir meu jogo. Aqui estão minhas cartas: sou fã de carteirinha de Berlusconi. O mundo seria mais triste sem ele, a Itália menos Itália.
Em Berlusconi, admiro cada fio de cabelo implantado, cada vestígio de botox no rosto, cada marca deixada por bisturi, cada signorina que acompanha o icônico e emblemático líder em suas andanças e deitanças pela Itália e pelo mundo afora.
Sempre que ele surge nas manchetes britânicas, o que é frequente, já que os ingleses que nunca entenderam os filmes de Steno ou Dino Risi, tomam-no por um vulgar fanfarrão, vou até minha eclética discoteca e ponho no aparelho de som os dois CDs que ele gravou na primeira década deste século.
Relaxam meu sistema nervoso ligado às atualidades políticas e fazem-me esquecer Orlando Silva (nosso ex-ministro e não o ?Cantor das Multidões?).
Comprei os CDs de Berlusconi – e não adianta procurar nem na Amazon nem no YouTube que você não vai encontrar – em Roma no ano de 2008 e são um dos pontos altos de minha coleção.
Boto as bolachinhas prateadas em sua ordem cronológica. Primeiro, o de 2003, com o atraente título de Miglio ‘ne Canzone (Melhor Uma Canção), acompanhado pelo guitarrista Mariano Apicelli, que musicou os versos do próprio Silvio e que evocam a melhor tradição napolitana da arte da canção. Este CD esteve merecidamente entre os 50 mais vendidos naquela época.
Em seguida, sempre em colaboração com Apicelli, seu Umberto Bossi, no sentido de parceiro de coalizão musical, o L’ultimo Amore (O Último Amor), 14 cançonetas registradas em 2006, todas versando sobre seu segundo tema favorito: o amor, está claro, que só perde em sua pauta para a sua dedicação política.
Uma dedicação, registre-se, até em goma-laca ou vinil, que voltou a despontar quando recuperava-se de um nariz amassado e dois dentes quebrados após um elevado debate no Parlamento com um adversário político (Mario Monicelli, onde estavas tu?). Um terceiro álbum da dupla, programado para 2010, não saiu da fase do planejamento, dada as repetidas crises por que, na época, passava a Itália.
Eu disse ?voltou a despontar? e disse-o bem. Quem achar que é ousadia do premiê meter-se num estúdio de gravação está mal informado. Silvio Berlusconi foi crooner de navio de cruzeiro em sua ainda recente mocidade. Ele sabe a diferença entre uma breve e uma semínima.
Sinto apenas que Berlusconi não tenha pensado em gravar algo que fosse mais meu gênero, ou seja, músicas da idade de ouro da canção americana (1930-1950). Sinto arrepios só de pensar, e eu penso em como ficariam em sua voz melodiosa acompanhada de uma big band preciosidades como BlueMoon, Let’s Do It, You’ve Changed e por aí afora.
Se o papa gravou cantando acompanhado por filarmônica um álbum para o Natal de 2009, Berlusconi não pode ficar atrás do sacro só por ser secular e também patrimônio internacional.
O título desta coluna é a sugestão para o nome do disco. Que, além do mais, pegaria muito melhor que ele distribuísse ao invés de medalhas e comendas entre os altos dignatários com quem convive e, espero eu, continuará a conviver durante muitos e muitos anos.
Extraído de: Sítio da BBC Brasil
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