O ambiente no ninho tucano se deteriorou após o que deveria ser um ato de apoio do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso ao esforço de campanha do candidato José Serra. Até a entrada em cena de FHC, o ambiente no comitê era de relativo otimismo com a redução na velocidade da queda nas pesquisas, mas aí o tempo virou. Neste 7 de Setembro, a apatia própria dos feriados deu lugar ao visível estupor dos principais agentes políticos na campanha serrista, após as repercussões acerca de uma entrevista na última edição de um diário conservador paulistano.
O sociólogo que deixou a condução do governo brasileiro com altos índices de rejeição popular havia externado sua constatação acerca do quadro eleitoral paulistano. Na leitura de parte do núcleo tucano, ao constatar que a realidade significa ao PSDB uma “fadiga de material”, FHC prepara terreno para a possível exclusão de Serra do cenário eleitoral, em 2014, e o surgimento de uma nova opção para o eleitorado conservador.
Segundo FHC, o eleitor paulistano parece cansado da fórmula aplicada à administração da cidade há 18 anos, sempre ligada ao domínio da facção de extrema-direita que sustenta a intenção de Serra voltar ao cenário político nacional. Segundo o doutor em Ciências Políticas pela Universidade de São Paulo (USP), há um quadro de “cansaço do eleitorado com a predominância do PSDB por longo tempo (no poder)”. Atento ao fato de falar na qualidade de um dos principais líderes do partido pelo qual José Serra seguiu ao escrutínio público, FHC pondera que, enquanto Russomanno subiu, “os outros estão praticamente no mesmo lugar”. Para se preservar na qualidade de estrategista renomado, experimentado nas derrotas do neoliberalismo nas três últimas investidas ao Palácio do Planalto, mas sem jogar a toalha no ringue eleitoral do maior reduto daquela legenda, o ex-presidente torce para que o prestígio de seu representante tenha parado de cair.
– Parou, se estabilizou em outro patamar – afirma, otimista.
Para FHC, após sublinhar o grau de dificuldade dos tucanos na campanha paulistana, o quadro eleitoral ainda permanece indefinido e o desenlace ocorrerá somente “nas semanas finais” que antecedem o pleito. O fato é que as mensagens gravadas, tanto por FHC quanto pela presidenta Dilma Rousseff (PT), que começam a chegar ao horário eleitoral nos veículos de comunicação de massa, elevam os níveis de compreensão do eleitorado para as diferenças, ideológicas e pragmáticas, entre as propostas oferecidas à gestão pública tanto por Serra quanto por seu adversário petista, Fernando Haddad. Ambos os presidentes da República, o anterior e a atual, no entanto, parecem abstrair do fato de que o candidato mais bem posicionado não é aquele para o qual pedem votos, mas o prosaico Celso Russomano, do minúsculo Partido Republicano Brasileiro (PRB).
A disputa real ocorre, segundo o entrevistado, na escolha do adversário de Russomano. A solução apresentada por FHC é a de um aprofundamento das questões ideológicas, que dividem os discursos de Serra e Haddad quanto à qualidade na administração da maior cidade latino-americana. O conservador de direita prega “a reafirmação corajosa de suas teses e a defesa de valores” como forma de se apresentar o antagonismo à tendência de esquerda do adversário petista. Para tanto, diz ele, será necessário mostrar o que fez para o Brasil. Na queda de braço com Dilma, a sucessora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, FHC tem uma única solução.
– (Precisamos) defender o que fizemos – propõe o autor da frase “esqueçam tudo o que eu disse”.
FHC adverte que “ir para o segundo turno é fundamental”, embora sua intervenção assemelhe-se mais a um aceno para o futuro, diante da possibilidade real de os tucanos serem excluídos do processo eleitoral paulistano, após 7 de Outubro, como indicam as pesquisas de opinião, nas quais Haddad em alta e Serra em declínio encontram-se em um empate técnico. Na cena nacional, porém, a resposta ao sinal de FHC ficou por conta do senador Aécio Neves (PSDB-MG), desafeto velado de Serra. Em sua visita a Jundiaí, no interior do Estado, o político mineiro rasgou seda para FHC:
– O PSDB cometeu o pecado, no passado, de não ter valorizado o nosso legado – ecoou o ex-governador mineiro, principal artífice da derrota de Serra nas Alterosas, durante as últimas eleições presidenciais, segundo analistas políticos ouvidos pelo Correio do Brasil.
Aécio Neves aproveitou para assoprar a brasa para a água do seu cafezinho ao assumir parcela de responsabilidade na ideia de colocar FHC para defender os candidatos tucanos nas principais cidades do país, a começar por São Paulo. O senador assume que está “estimulando o presidente a entrar na campanha em algumas capitais”.
– Queremos introduzir na agenda do Brasil a gestão pública de qualidade para se contrapor a esse absurdo aparelhamento do Estado brasileiro – afirmou Aécio, durante um discurso para adeptos, no interior paulista.
Passado
Engasgado com o espeto de FHC, na entrevista, e a aparição do líder tucano na mensagem de apoio à campanha tucana, Serra optou nesta sexta-feira por minimizar o gesto do ex-presidente e o colocou como apenas mais um a falar em sua defesa, perante o eleitorado paulistano.
– É um companheiro de partido que vai falar, como muitos outros – reduziu.
Ao perceber, no entanto, que havia diminuído demais a presença do presidente de Honra da legenda que o suporta, Serra sorriu, mas sem mostrar os dentes:
– Sem dúvida é um homem de muito valor. A palavra dele sempre é uma palavra que pesa, mas não há nenhuma grande estratégia por trás.
Ainda arde na lembrança de Serra uma outra entrevista de FHC, desta feita à porta-voz dos conservadores britânicos, a revista semanal The Economist, na qual o neoliberal brasileiro apontou os erros do então candidato na campanha presidencial de 2010. Para deixar a situação entre os dois ainda pior, em fevereiro deste ano, em outra entrevista ao diário O Estado de S. Paulo, Cardoso disse que a disposição de Serra em disputar a prefeitura o “reabilitava no cenário nacional”. Aquela intervenção, como esta atual, no Dia da Independência, escancara o receio do ex-presidente de ver reabilitado o candidato que perdeu as últimas eleições para “o poste”, como disseram colunistas do próprio Estadão, determinado por Lula para assumir o Palácio do Planalto.
O degelo promovido nas relações entre FHC e Serra, a cargo de José Henrique Reis Lobo, aliado de Serra e amigo de FHC, permitiu que ex-presidente entrasse na campanha, a pedido do marqueteiro Luiz González. Este último pensava que o depoimento seria benéfico contra a defecção de eleitores tucanos que, dia após dia, migram em massa para a banda de Russomanno. Esta posição, no entanto, após a repercussão das palavras de FHC ao jornal, está em questionamento junto aos dirigentes da campanha de Serra.
Extraído do sítio Correio do Brasil
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