Se fosse advogado Ricardo Noblat não passaria no exame da Ordem. E como jornalista deveria se aprofundar nos temas que discute. O articulista resolveu se meter a censor do Supremo Tribunal Federal (STF) dizendo quem pode e quem não pode julgar a Ação 470. Mais: atenta contra a Constituição Federal.
Não vou entrar na polêmica se realmente Noblat ouviu o ministro José Antônio Dias Toffoli fazendo comentários desairosos sobre sua pessoa. Me atenho ao seu comentário em video (link: http://youtu.be/cvyLfkZs-jo ), onde elenca motivos para que Dias Tóffoli não julgue:
1 – Lula o nomeou ao STF depois de sua passagem pela Advogacia Geral da União;
2 – Foi assessor do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu;
3 – Sua atual esposa foi advogada de três acusados.
Os ministros Carlos Ayres Brito, Cesar Peuluzzo, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandoviski, Carmen Lúcia também foram nomeados pelo ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva. Estariam eles também sob suspeição?
Quando foi da Advocacia Geral da União e quando esteve à serviço do ministro José Dirceu o ministro Dias Tóffoli praticou algum ato que desabonasse sua conduta?
Para ser ministro do STF é preciso autorização prévia de órgãos de imprensa, CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para contrair matrimônio?
No seu comentário Ricardo Noblat declara:
“Se ele (Tóffoli) votar pela inocência de pessoas com as quais viveu e algumas com as quais trabalhou, sempre vai se dizer que prestou um serviço a quem o nomeou”.
Sob esta ótica o voto de cinco colegas de Dias Tóffoli estaria “contaminado”, pois foram todos nomeados pelo governo que Dias Tóffoli participou.
A pergunta mais importante, que em nenhum momento é feita pelo jornalista é: E se todos forem inocentes? Neste caso, mesmo comprovada a inocência o ministro Dias Toffoli deveria votar pela condenação apenas para “não ficar mal com a mídia”?
Diz o texto da Constituição Brasileira de 1988 em seu artigo 5.°, inciso LVII: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Desta forma, o acusado de ato ilícito tem o direito de ser tratado com dignidade enquanto não se solidificam as acusações, já que pode-se chegar a uma conclusão de que o mesmo é inocente.
Ao colocar em xeque a honra do ministro Dias Tóffoli, e, sobretudo, macular o princípio sagrado da presunção de inocência, o jornalista pre-julga os réus, o STF e agride nossa Carta Magna.
A Suprema Corte Brasileira pautou-se sempre como guardiã do Direito e da Justiça. Sem provas, In dubio pro reo, pois um juiz de instância maxima não julga ao sabor dos humores da opinião pública, tampouco da opinião publicada. Fosse assim não teríamos um ordenamento jurídico, perdendo efeito toda jurisprudência que baliza as decisões de nossos magistrados.
Noblat talvez devesse refletir sobre o exemplo da Suprema Corte dos Estados Unidos. Lá é notória a divisão entre juízes conservadores (nomeados pelos Republicanos) e liberais (nomeados pelos democratas). O equilíbrio politico entre uma posição e outra se dá justamente onde interessa ao cidadão: na jurisprudência. É o que registra matéria de João Ozório de Melo, no site Conjur (Consultor Jurídico):
“A Suprema Corte dos EUA tem nove ministros — cinco conservadores e quatro liberais. Na ala conservadora estão o presidente da Corte, John Roberts (indicado por George Bush) e os ministros Antonin Scalia (indicado por Ronald Reagan), Anthony Kennedy (Ronald Reagan), Clarence Thomas (George Bush) e Samuel Alito (George Bush). Na ala liberal, estão o ministro Stephen Breyer (indicado por Bill Clinton) e as ministras Ruth Bader Ginsburg (Bill Clinton), Sonia Sotomayor (Barack Obama) e Elena Kagan (Barack Obama).
Nos últimos tempos, o ministro conservador Anthony Kennedy assumiu a posição de fiel da balança da Suprema Corte, se alinhando com os conservadores ou com os liberais de acordo com suas convicções jurídicas, em cada um dos casos.
Os brasileiros e brasileiras esperam que o STF faça justiça, seja o guardião da Constituição Federal e consagre o respeito ao devido processo legal. Ninguém pode ser condenado sem provas. Nenhum ministro pode ser posto sob suspeição antes de manifestar juridicamente seu voto.
As tentativas de cerceamento da defesa dos réus, a espetacularização do julgamento, a intimidação de ministros nos fazem lembrar os momentos mais tristes da imprensa brasileira, quando nos idos de 1964, veículos como O Globo, no qual o articulista escreve, rasgou a Constituição de 1946 para apoiar abertamente o golpe contra um presidente legitimamente eleito pelo voto popular.
O retorno à democracia, ao Estado de Direito e às liberdades individuais custou o sangue de centenas de brasileiros. Não é digno da memória dos que tombaram campanhas histriônicas para que o STF, justo a nossa Suprema Corte, patrocine um atentado à Constituição Cidadã.
* Marcus Vinícius é jornalista e edita o www.marcusvinicius.blog.br.
Extraído do blog de Marcus Vinicius
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