13 abril 2012

VENEZUELA: MANUTENÇÃO DA DEMOCRACIA PASSA POR REGULAÇÃO DA MÍDIA - Vanessa Silva

Nesta sexta-feira (13), a Venezuela celebra o 10º aniversário do retorno do presidente Hugo Chávez ao poder, após ter sofrido um golpe de Estado 48 horas antes. Para o jornalista Gilberto Maringoni, autor do livro “A Venezuela que se inventa”, o golpe midiático consistiu uma realidade virtual, mas a mídia não atuou sozinha, como esclarece em entrevista ao Vermelho. E ressalta que o Brasil também poderá ter problemas com a falta de democracia nos meios do país.

Simpatizantes do presidente venezuelano Hugo Chávez participaram, na quinta-feira (12), de um ato em frente à embaixada de Cuba em Caracas/ Foto: Efe


Mesmo após a volta de Chávez “nos braços do povo”, a situação política do país continuou tensa. Um mês após o golpe, a oposição fez uma grande manifestação com cerca de 100 mil pessoas no Parque Del Este pedindo sua saída. 

A truculência da mídia, no entanto, continuou a mesma. Para Maringoni, o que aconteceu no país foi a criação de uma realidade paralela. “Eu estive [na Venezuela] logo depois do golpe. A realidade mostrada nas telas, nas rádios, um pouco na internet (que era incipiente) e nos jornais, era uma coisa muito distinta do que você via nas ruas. Um mês depois do golpe, o país estava tenso, mas já existia um clima de tranquilidade, já se respirava um clima político mais calmo, aliviado depois da tensão da saída do Chávez”.

Enquanto isso, nos meios de comunicação a tensão continuava “em um clima quase histérico de ataques diários ao governo e à figura do presidente da República. E isso continuou quase um ano após o golpe”. 

A mídia não estava sozinha, ressalta. “Ela não é uma entidade boiando no espaço sem os pés solidamente fincados em um objetivo claro dentro e fora da Venezuela. [O golpe] foi a expressão da ação das classes dominantes, da cúpula da Igreja Católica, e da Casa Branca”, mas na criou uma “realidade paralela”, completa.

Em artigo publicado nesta semana, o jornalista Rodrigo Vianna, denunciou que os boatos que são produzidos contra a Venezuela, agora partem do Brasil e não mais dos EUA. Sobre o assunto, Maringoni acrescenta que “a imprensa brasileira age como age a imprensa de direita dos EUA, da Argentina, da Venezuela. É contra a mesma coisa: contra o movimento social, contra os governos de esquerda na América Latina”. Essa mídia, no caso venezuelano, “continua batendo, fazendo uma luta ideológica de envergadura”, complementa. 

Mídia e regulação

Nos últimos anos, países progressistas latino-americanos têm investido na regulação da mídia. ArgentinaEquador avançam neste quesito. Para o jornalista, essas iniciativas “fazem parte de um sentido geral de que os meios não podem estar acima das instituições democráticas”.

Ele lembra que “as experiências latino-americanas são traumáticas. O apoio que a mídia deu aos golpes [civis-militares] no Brasil e na Argentina é escandaloso”. Neste sentido, aponta que a “Lei [dos Meios] argentina é a mais completa, mais abrangente. É uma lei bastante extensa, mas o centro dela é impedir a monopolização dos meios de comunicação. A consigna deles é ‘que falem todos’, é proibir que cada meio domine mais que 33% do mercado”.

Apesar do avanço na discussão, o autor considera que ainda é preciso ir além. “Aqui no Brasil estamos muito atrasados. Os movimentos sociais fizeram uma ação inédita, que foi a Confecom [Conferência Nacional de Comunicação] em dezembro de 2009, em Brasília. De lá saíram mais de 1.600 proposições, que depois foram sintetizadas por um conjunto de entidades em 20 propostas que até hoje dormem na gaveta de algum burocrata em Brasília”. 

E vaticina: “acho que podemos ter problemas sérios com a falta de democracia nos meios brasileiros em um futuro muito próximo”. 

Mais golpes

O golpe na Venezuela foi o primeiro de uma série de intentos golpistas na América Latina do século 21. Em 2008, o governo boliviano viveu uma tensão durante o referendo revogatório; em 2010, houve uma revolta policial no Equador; e em Honduras, em 2009 foi perpetrado o único golpe com sucesso no continente contra o então presidente Manuel Zelaya. Maringoni acrescenta, nesta lista, o processo do Mensalão no Brasil.

“Eu acho que eles aconteceram em momentos diferentes. O da Venezuela é definidor. Deixou clara, na cara de todos, a conspiração que os meios de comunicação no continente podem armar, podem articular e o perigo disso. Eles sempre defenderam as oligarquias, as classes dominantes e a revista Veja que não deixa ninguém mentir”.

Apesar da importância dos acontecimentos na Venezuela em 2002 não só para a trajetória do país, mas de toda América Latina, a imprensa brasileira calou-se sobre o episódio. Após ter comemorado o levante militar, a imprensa não poderia admitir que estava errada. Hoje, “o silencio da mídia é esclarecedor quanto ao golpe. Eles continuam pensando igual. Não fizeram nenhuma auto-crítica”.


Extraído do sítio Vermelho

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