Obama e Romney se esforçam para expor diferenças nas suas propostas para a política externa. Mas o próximo presidente irá encarar uma dura realidade e terá pouca margem de manobra.
Durante a campanha eleitoral, o ex-governador de Massachussets Mitt Romney procurou apresentar uma alternativa à política externa do presidente Barack Obama. Romney anunciou que pretende liderar os Estados Unidos para o próximo "século americano" atuando com "clareza e firmeza" no cenário internacional.
A retórica de Romney mira a parcela do eleitorado que vê os EUA como o país mais importante do mundo, mas que perdeu influência por causa de dez anos de guerra e a pior crise financeira desde a Grande Depressão. Apenas 24% dos americanos dizem que seu país tem hoje um "papel mais importante" como líder mundial do que há uma década, segundo um estudo do Conselho de Chicago sobre Assuntos Globais.
"Quando Obama foi eleito, a avaliação predominante era a de que os Estados Unidos haviam se engajado demais em algumas regiões. Essa avaliação se manifestou claramente na decisão de sair do Iraque", comentou o especialista em política externa americana Stephen Walt, da Kennedy School of Government, na Universidade de Harvard. "Mesmo quando Obama decidiu se engajar ainda mais no Afeganistão, ele deu um prazo."
Durante a intervenção ocidental na Líbia, Obama liderou de forma indireta |
Diferenças no tom
Os Estados Unidos, já envolvidos em conflitos em vários regiões do mundo, começaram a agir de forma mais cautelosa durante o governo Obama. Em maio de 2011, durante a guerra civil na Líbia, um assessor do presidente disse à revista New Yorker que ele estava "liderando por trás", ou seja, de forma indireta.
Em outras palavras, Obama apenas criou as condições políticas e logísticas para a ação dos aliados na Otan contra o avanço militar do coronel Muammar Kadafi sobre os rebeldes – sem que Washington tivesse que oficialmente liderar a intervenção.
A declaração foi lenha na fogueira dos conservadores, que rejeitam categoricamente que os Estados Unidos deixem a primazia em questões externas a uma outra nação ou organização. Durante a convenção republicana em Tampa (Flórida), em agosto deste ano, a ex-secretária de Estado Condoleezza Rice disse, sob aplausos, que "nós não temos escolha, não podemos ser relutantes ao liderar, e não se pode liderar por trás".
"Romney tende a adotar um tom mais triunfalista", diz Walt. "Ele claramente enfatizou seu compromisso com o que a maioria das pessoas chama de excepcionalismo americano, de que os EUA são uma nação diferente, com responsabilidades diferentes, e um conjunto de valores diferente do resto do mundo."
Romney enfatizou seu compromisso com o excepcionalismo americano |
"A ameaça interna"
Mas a capacidade de um país afetado por problemas econômicos de liderar um mundo imprevisível e agitado por revoluções é limitada, opina o especialista em política externa americana Josef Braml, do Conselho Alemão de Relações Exteriores.
"Se Romney vencer, ele também terá de se adaptar à realidade", opina Braml. "Falar costuma ser fácil. Mas se ele de fato for eleito, terá de transformar suas ações em palavras, e aí vai perceber que será confrontado com as mesmas realidades."
Essas realidades não resultam de uma caótica ordem mundial em movimento, mas principalmente das alterações sociais e econômicas internas que dividem os Estados Unidos, diz Braml.
Ele argumenta que o deficit nos gastos das famílias e do governo alcançou um limite insustentável. E que o estímulo econômico e a extensão dos cortes de impostos do governo Bush estão alcançando o limite de sua efetividade. Ao mesmo tempo, o governo está paralisado por causa da briga entre a presidência democrata e uma Câmara dos Deputados dominada por republicanos.
"A maior ameaça aos EUA não é externa, ela vem da fraqueza interna", argumenta Braml. "Quando você olha para a avaliação da segurança nacional, é a mesma coisa. Não estou prevendo o desmoronamento de mais uma superpotência, mas devemos ter cuidado. A ameaça interna é muito importante e limita o espaço para manobras em outros assuntos."
Os EUA procuram reduzir a presença dos militares no Oriente Médio e na Ásia Central |
"A discussão política termina à beira d'água"
Estas fraquezas internas – crescimento econômico abaixo do esperado e desemprego em alta – têm sido o foco primário da campanha presidencial e a área que marca as reais diferenças entre os dois candidatos, principalmente nos aspectos política fiscal e sistema de saúde.
Mas como o senador republicano Arthur Vandenberg disse em 1947, no começo da Guerra Fria, sobre a política externa americana: "A discussão política termina à beira d'água" [politics stops at the water's edge, ou seja, as questões políticas internas não devem ultrapassar as fronteiras do país e influenciar a política externa. "À beira d'água" é uma alusão às costas leste e oeste americanas]. Mesmo no país polarizado dos dias atuais, o ditado tem muito de verdade.
"Tanto republicanos como democratas estão comprometidos com a liderança americana no mundo. Eles estão comprometidos com os EUA permanecendo como o país com o maior poderio militar", diz Walt. "Eles estão convencidos de que os EUA precisam se envolver na resolução da maioria dos problemas internacionais. Ninguém fala seriamente sobre uma retirada e muito menos sobre isolamento."
Embora Obama tenha sido caracterizado como progressista pelos dois polos do espectro político na eleição de 2008, ele não fez jus à essa avaliação, dizem especialistas, ao menos nas questões internas. O Prêmio Nobel da Paz ampliou a presença no Afeganistão, aumentou o uso de aviões não tripulados no Iêmen e no Paquistão e procura impor sanções mais duras ao Irã.
"O problema central é que Obama, na verdade, tem conduzido uma política de centro, talvez até mesmo de centro-direita", diz Walt. "Não tem sido uma política externa de esquerda, de forma alguma. E isso deixa pouco espaço para Romney conseguir se diferenciar."
Extraído do sítio Deutsche Welle
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