23 junho 2012

FERNANDO LUGO REALMENTE É UM MAU GESTOR? - Paulo Daniel

Lugo perdeu apoio no Congresso, mas boa parte da população continua a seu lado. Imagem desta sexta-feira 22 mostra manifestação favorável a Lugo em Assunção. Foto: Norberto Duarte / AFP
É surpreendente, mas nem tanto, a decisão do Congresso paraguaio em realizar um processo de impedimento contra o presidente Fernando Lugo. No final de 2009 já surgiram fortes rumores de que o Legislativo tentaria tirar Lugo do poder por meio de instrumentos legais para colocar em seu lugar o vice-presidente, Federico Franco, do PLRA (Partido Liberal Radical Autentico).

Naquela época, já se esboçava a hipótese entre políticos do Partido Colorado (conservador) e do PLRA, supostamente aliado ao governo, em destituir Lugo de forma muito similar à que ocorreu nesta quinta-feira 21. Os próprios parlamentares impetraram processo contra o presidente que seria destituído, então, por meios constitucionais. A justificativa maior para depor o Presidente paraguaio era que o país deveria ser mais atraente aos investidores estrangeiros.

Pois bem, de acordo com dados da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), desde quando Lugo assumiu os investimentos estrangeiros líquidos praticamente triplicaram. Para se ter uma ideia, em 2007, quando o partido Colorado comandava a política e a economia paraguaia, as inversões líquidas internacionais chegaram a US$ 199 milhões. Com Lugo, já em 2009, esse número saltou para US$ 225 milhões; em 2010, para US$ 389 milhões; e, em 2011, para US$ 566 milhões. Portanto, na época e atualmente, a justificativa da oposição era facilmente combatida.

Agora, Lugo é acusado de má gestão do país, em especial em relação a um confronto entre policiais e trabalhadores rurais em uma fazenda no último dia 15, que terminou com 17 mortos. Ainda assim, continuam pesando contra Lugo o argumento de que a economia vai mal.

Pois, então, avaliemos alguns dados econômicos paraguaios. Realizando-se uma comparação entre os anos de 2010 e 2011, observa-se um aumento médio nos salários de 8,7%, sendo os setores de comércio (11,5%) e intermediação financeira (10,5%) que obtiveram as maiores elevações. O salário mínimo paraguaio aumentou 2,7% e corresponde a pouco mais de R$ 660,00. No que diz respeito à inflação, ocorreu uma redução de 7,2% em 2010, para 4,9% em 2011. Após apresentar o maior crescimento da América Latina em 2010 (15%), no ano seguinte o PIB (somatória de todas as riquezas de um país) paraguaio elevou-se em 3,8%, representando um incremento de 2,3% do PIB per capita.

Esse resultado reflete, por um lado, o contínuo dinamismo do setor agrícola e, por outro lado, o baixo desenvolvimento, de setores como a pecuária e construção civil. No mesmo período, observou-se uma elevação das despesas públicas e, ao mesmo tempo, a elevação das receitas do governo, o que contribui para um superávit primário das contas do governo de 0,8% do PIB. As exportações, em uma comparação entre 2010 e 2011, registaram crescimento de 23,1%, enquanto a alta das importações foi de 21,5%. O déficit em conta corrente caiu para 2,1% do PIB, representando uma melhora em relação ao ano de 2010, quando foi de 6,1%. Portanto, não há nenhum problema de má administração, ou que lhe desabone que justifique o seu impedimento em permanecer como presidente.

A questão central é que, primeiro; a maioria dos deputados que desejam o impedimento de Lugo são proprietários de grandes latifúndios e a situação da oligarquia paraguaia se tornou insustentável quando o presidente colocou em debate questões tão sensíveis como a reforma agrária. Além do que, esse movimento dos partidos Colorado e Liberal Radical Autêntico (responsáveis pelo processo de impeachment na Câmara de Deputados e no Senado) foi planejado para atrapalhar as eleições presidenciais de 2013.

O que está representado e configurado é um golpe sumário travestido de ato legal. A política é para ser debatida, discutida, dialogada, algo que o Congresso paraguaio, infelizmente, não está disposto a fazer. Espera-se que as forças políticas internacionais e nacionais mantenham Fernando Lugo na Presidência e que as divergências políticas resolvam-se de forma direta pela vontade popular nas eleições que já estavam programadas, em março de 2013, muito antes dessa crise ter atingido seu ápice.


Extraído do sítio CartaCapital

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